Maioria das leis do CE de 2018 são "decorativas"

Mais da metade das leis estaduais do Ceará sancionadas ou promulgadas no ano passado têm pouca serventia para a vida dos cidadãos do estado. Das 292 leis aprovadas pela Assembleia Legislativa cearense com data de 2018, 157 são essencialmente decorativas.

A mais comum delas é a que denomina alguma obra de arte arquitetônica empreendida pela administração estadual: são 75 as leis desse tipo. Por essas leis, receberam nome oficial 34 “areninhas”, 19 trechos de rodovias, 9 estabelecimentos de educação, 6 prédios (inclusive uma delegacia de polícia), 2 ginásios poliesportivos, 2 barragens, 1 hospital, 1 túnel e o Cinturão das Águas (que leva o nome do ex-deputado estadual Welington Landim). Duas leis dão apelidos a cidades. Salitre virou a capital cearense da mandioca; Iguatu, a “Cidade Casa da Vó” (referência religiosa à padroeira do município, Sant’Ana, avó de Jesus Cristo).

Dezesseis leis instituem semanas temáticas, uma delas religiosa (a Semana Estadual de Valorização da Família Cristã) – ainda não existe a Semana Estadual de Valorização da Família de Religião Afro-Americana. Outras 19 leis criam dias estaduais de qualquer coisa para serem incluídos num tal “Calendário Oficial de Eventos”, que já deve estar superlotado de inscrições em suas páginas. Também para serem incluídas no famoso (ou infame) calendário, festas são o tema de onze leis, nove delas referentes a festejos religiosos.

Meses coloridos também foram assunto para deliberação dos nossos parlamentares estaduais, que aprovaram o vermelho para junho, o verde para dois meses diferentes (março e setembro) e duas cores para maio (cinza e laranja) – cada qual referente a uma campanha educativa. Outras três leis instituíram campanhas educativas que não ganharam meses nem cores.

O “Calendário Oficial de Eventos” (em uma ocasião chamado de “Calendário Turístico do Estado”) ganhou anotações de mais outras dezessete leis estaduais, referentes a coisas tais como arraiás e regatas. Sete destas 17 leis dizem respeito a eventos de cunho religioso, um deles inclusive de caráter bastante pessoal: o “evento religioso Evangelizar Cariri com o Padre Reginaldo Manzotti” (como consta na lei).

Oito pessoas nascidas fora do estado ganharam o título de cidadão cearense (ao que parece, ter feito algo diretamente em favor do Ceará não é condição para a aprovação do título). Por fim, uma lei é do tipo clássico que obriga a afixação de cartaz para dar um recado sobre algo importante que, sabe-se lá, as pessoas vão ler.

Quando este levantamento foi feito, pouco menos de um mês atrás, 65 leis já haviam sido publicadas com a data de 2019. Onze delas deram denominações a “areninhas”, rodovias ou escolas. Três incluíram eventos religiosos no calendário de eventos. Uma outra, com termos um pouco mais pomposos, declarou “patrimônio de destacada relevância histórico-cultural do estado do Ceará os festejos juninos realizados nos municípios cearenses”.

Mas o melhor dessa nova safra é a lei decorativa da lei decorativa: a que obriga o governo a instalar placa com a indicação do nome do autor e da lei que deu nome a seja o que for: “prédios, logradouros, monumentos e bens públicos de qualquer natureza”. Este ano promete.

Fonte: https://www2.al.ce.gov.br/legislativo/legislacao5/leis2018/e2018.htm

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