Texto originalmente publicado no "Diário do Nordeste" em 02/08/1997
Chegando à sede do município, é fácil encontrar a casa dele. Basta perguntar a qualquer passante onde mora o Seu Cazuza, um velho resistente, turrão, que tem tantos anos quanto Limoeiro. Ele nasceu no ano da emancipação política da cidade, 1897. Mas se alguém perguntar por Francisco Possidônio Guimarães, seu nome de batismo, ninguém o conhece. Aos mais próximos, como Terezinha, sua esposa, a segunda em um século de vida, ele consegue lembrar-se de fatos históricos interessantes, como a passagem de Lampião e seu bando por Limoeiro. Mas lhe falta memória para saber que o atual presidente do Brasil é Fernando Henrique Cardoso.
Inevitável comparar o estado de conservação de Seu Cazuza com o da cidade. Ele está muito melhor. Toma uma "meiota" (equivalente a uma garrafa de água mineral), diariamente, de cachaça e continua firme. Já os prédios antigos de Limoeiro parecem mais frágeis. A igreja matriz, cuja edificação data de 1845, com a graça de Deus, está inteira, mas, sendo ela um prédio histórico de uma cidade, poderia estar mais bem preservada. Principalmente como forma de gratidão pela importância que teve a Igreja para o desenvolvimento local.
Seu Cazuza é irônico. Quando a gente pede para contar tim-tim por tim-tim como foi essa história de Lampião em Limoeiro, ele desconversa. "Não lembro mais de nada. Eu tô muito novo". Ele completa 100 anos de idade no dia 3 de outubro, todos vividos em Limoeiro do Norte. O lugar mais distante que conheceu: Fortaleza. Como a litorânea Aracati (de Canoa Quebrada e Majorlândia) é próxima a Limoeiro, Seu Cazuza conheceu o mar ainda novo. No último fim de semana, foi com um filho para uma casa de praia em Majorlândia. "Mas não tem mais a graça de antigamente. Não posso nem quebrar uma casca de caranguejo para tomar com cachaça", lamenta-se.
Fora dormir, beber uma boa dose da "branquinha" é o que mais gosta de fazer. Seu maior desejo? Bem, numa conversa rápida fica difícil arrancar a resposta de Seu Cazuza. O máximo que se consegue é uma vaga "minha vida é dormir, não penso em nada". Segurança mesmo, só quando diz "coisa que não gosto é de política".
Teve, juntando os dos dois casamentos, 20 filhos. Entre o primeiro casamento e o outro, passou 13 anos viúvo. Casou-se pela segunda vez, em 1951, numa igreja em Tabuleiro do Norte. Seu Cazuza era fiscal da Previdência e trabalhava em Tabuleiro. Numa dessas viagens a trabalho, conheceu Terezinha, 35 anos mais nova que ele. Ela tinha, na época, 19 anos. Para vê-la, independente de haver trabalho ou não em Tabuleiro, Cazuza ia de uma cidade para a outra pedalando sua inseparável bicicleta. Não fugia da tradição de Limoeiro do Norte.
(...) Hoje, Seu Cazuza e Dona Terezinha moram num conjunto habitacional de Limoeiro conhecido como "Populares". Os dois são bastante conhecidos na cidade. Seu Cazuza é uma espécie de patrimônio por viver tanto tempo e ter nascido no mesmo ano em que Limoeiro tornou-se município. Ele será uma das cem pessoas escolhidas pela comissão organizadora dos festejo a receber a Comenda do Centenário. A entrega acontece no dia 30, dia do aniversário da cidade, às 9h, no auditório do Centro Tecnológico (Centec).